ADKAR: metodologia para gestão de mudanças
Volume 38 Nº 1 (2024) REGEM set 2024
ISSN 2763-8022 (International Standard Serial Number)
por Saulo Carvalho, MSc.
*direitos reservados ©. Texto com liberdade de citação: CARVALHO, S.
O que você irá ler nesse artigo:
ToggleADKAR: a metodologia de gestão de mudanças como catalisador para transformações sustentáveis!
Em qualquer processo de mudança organizacional, a resistência é um fator comum e desafiador, especialmente quando falamos de transformações que impactam diretamente a cultura e o modo de trabalho das equipes. A metodologia ADKAR, desenvolvida pela Prosci, é uma ferramenta estratégica que lida com esses desafios de forma prática e eficaz, dividindo a mudança em cinco marcos essenciais: Awareness (Consciência), Desire (Desejo), Knowledge (Conhecimento), Ability (Habilidade) e Reinforcement (Reforço). Esse método permite estruturar e acompanhar cada etapa da mudança para que ela seja não só implementada, mas efetivamente absorvida e mantida.
A estrutura do ADKAR na prática
Cada marco do ADKAR atua em uma fase crucial do processo, endereçando tanto os aspectos cognitivos e emocionais da mudança quanto as necessidades práticas e técnicas. Em minha experiência, já implementei essa metodologia em diversas organizações, em projetos de diferentes naturezas, incluindo a implantação de novos sistemas, transformação digital, mudanças culturais e reestruturações organizacionais. Abaixo, compartilho alguns desses casos para ilustrar como cada etapa do ADKAR se aplica de maneira concreta.
Consciência (Awareness)
O primeiro passo do ADKAR é criar uma consciência sobre a necessidade de mudança. Em um projeto para uma empresa de tecnologia que visava migrar seus sistemas para um ambiente cloud, o desafio inicial era fazer com que todos entendessem a urgência e os benefícios da transição. Nessa etapa, apliquei uma estratégia de comunicação ampla e segmentada: sessões de kick-off e workshops de sensibilização com apresentações que traziam dados sobre os riscos do sistema atual, como a vulnerabilidade de dados e as limitações para escalabilidade.
Para garantir que todos compreendessem o “porquê” da mudança, incluí estudos de caso de empresas que já haviam realizado essa migração e seus resultados positivos. A clareza nas comunicações e nos dados contribuiu para criar uma base sólida de entendimento entre os colaboradores, minimizando a resistência inicial.
Desejo (Desire)
Superado o momento de conscientização, a metodologia foca na criação de desejo pela mudança. Em uma situação de reestruturação de processos em uma indústria de manufatura, onde os operadores resistiam à automação, o desafio era motivar a adesão deles. O ponto de partida foi alinhar a transformação com os interesses pessoais e profissionais dos envolvidos, destacando que a automação permitiria que se concentrassem em atividades de maior valor agregado e que aumentariam suas habilidades técnicas.
Promover diálogos abertos com as lideranças e criar “embaixadores da mudança” – colaboradores da linha de frente que passariam a ser referência para seus pares – foi decisivo. Essa etapa gerou um efeito positivo e fez com que os funcionários mais reticentes vissem a mudança não como uma ameaça, mas como uma oportunidade de desenvolvimento.
Conhecimento (Knowledge)
O passo seguinte, Conhecimento, é onde fornecemos os treinamentos necessários para que os colaboradores saibam como adotar as novas práticas e o que é esperado deles. Um caso emblemático foi a implementação de um novo CRM em uma equipe de vendas de uma empresa de serviços financeiros. Após uma análise das lacunas de conhecimento, desenvolvemos um programa de capacitação intensiva, com módulos teóricos e práticos. Além dos treinamentos presenciais, oferecemos uma plataforma de e-learning para consultas posteriores, atendendo ao ritmo de aprendizado de cada colaborador.
Outro aspecto importante foi a criação de uma equipe de suporte dedicada, que permanecia disponível para esclarecer dúvidas e ajudar com dificuldades no início da utilização do sistema. Esse suporte técnico foi fundamental para acelerar a curva de aprendizado e reduzir a resistência, fazendo com que os colaboradores sentissem segurança para adotar o novo CRM no dia a dia.
Habilidade (Ability)
A Habilidade é a aplicação prática do conhecimento adquirido, que transforma o aprendizado em rotina. Em um projeto para uma empresa de varejo, onde precisávamos treinar a equipe para um novo sistema de gestão de estoque, a fase de habilidade exigiu uma abordagem hands-on. Conduzimos simulações diárias em situações de vendas reais e cenários de crise, onde cada membro era desafiado a aplicar o que aprendeu de forma prática.
As sessões de feedback eram constantes, permitindo correções em tempo real. A abordagem prática não só reforçou o aprendizado, mas também aumentou a confiança da equipe para lidar com o sistema em situações do dia a dia. Nos primeiros dois meses, já era visível a diferença na precisão dos registros e no controle de estoque, refletindo a eficiência da fase de habilidade.
Reforço (Reinforcement)
Por último, o Reforço é a fase onde garantimos que a mudança se mantenha e se fortaleça com o tempo. Em um caso de implementação de uma nova cultura de feedback contínuo em uma empresa de saúde, o reforço foi realizado com uma série de práticas: reconhecimentos públicos para aqueles que aplicavam a metodologia de forma exemplar, além de atualizações e revisões periódicas dos processos.
Estabeleci marcos de monitoramento para avaliar a eficácia dos novos comportamentos e promovi reuniões trimestrais para compartilhar resultados e lições aprendidas, reforçando o compromisso com a nova cultura. Esse acompanhamento regular permitiu que a prática de feedback se enraizasse na empresa, e hoje é um dos pilares da organização.
ADKAR: uma metodologia estratégica e adaptável
A força da metodologia ADKAR está em sua aplicabilidade universal e em sua adaptabilidade a diversos contextos organizacionais. Em todos esses cases, o foco em cada etapa permitiu um processo de mudança estruturado e minimizou os impactos negativos da resistência à mudança.
Ao aplicar o ADKAR, observo que a resistência não é eliminada por completo, mas, ao seguirmos essas etapas, conseguimos construir uma ponte entre o estado atual e o desejado, com cada colaborador atravessando de forma segura e informada. Essa abordagem resulta em transformações mais sustentáveis e em uma cultura de mudança contínua, fundamental para que as organizações se mantenham competitivas e preparadas para os desafios futuros.
Esse artigo técnico explora o ADKAR com exemplos detalhados, abordando a aplicabilidade da metodologia e sua importância estratégica em processos de mudança.
Veja a seguir alguns exemplos reais de projetos de Gestão de Mudanças como um proposta para um entendimento mais amplo da ferramenta:
Caso 1: implementação de cultura de inovação em uma empresa de tecnologia
Trabalhei em um projeto onde a missão era implantar uma cultura de inovação em uma empresa de tecnologia que estava se expandindo rapidamente, mas sofria com processos lentos e pouca iniciativa inovadora. Sabíamos que a inovação exigiria uma transformação profunda, especialmente na forma de pensar e agir da equipe.
Consciência: Realizei workshops para todas as equipes, onde discutimos como a inovação poderia acelerar os processos, reduzir custos e colocar a empresa à frente dos concorrentes. Apresentei dados de empresas do setor que usavam metodologias ágeis e ferramentas de colaboração, demonstrando resultados concretos.
Desejo: Identifiquei os “inovadores naturais” da equipe – aqueles colaboradores que já tinham o perfil desejado – e os posicionei como influenciadores. Criamos um grupo de inovação onde cada colaborador era incentivado a propor ideias para melhorias, e fizemos com que essas ideias fossem testadas de forma rápida, com protótipos de baixo custo, para gerar engajamento.
Conhecimento: Organizei uma série de treinamentos sobre técnicas de inovação, como Design Thinking e Metodologia Ágil, e disponibilizei conteúdo de apoio para consulta. Era essencial que todos conhecessem esses métodos para aplicá-los diretamente.
Habilidade: Apliquei sessões práticas de Design Thinking em projetos reais da empresa, onde a equipe podia testar o que aprendeu. Essa fase foi um divisor de águas, pois ajudou a consolidar o conhecimento em habilidades aplicáveis e tangíveis.
Reforço: Para fortalecer a nova cultura, fizemos ajustes nos processos de avaliação de desempenho, valorizando aqueles que contribuíam com ideias e implementações inovadoras. Com o tempo, inovação passou a ser um valor visível e ativo na empresa.
Caso 2: mudança para um sistema ERP integrado em uma empresa de logística
Em outra ocasião, atuei na implementação de um novo sistema ERP em uma empresa de logística. O desafio aqui era substituir um sistema antiquado que limitava a gestão de inventário, mas havia forte resistência dos operadores devido à complexidade da nova plataforma.
Consciência: Para introduzir o projeto, iniciei sessões de conscientização, mostrando o custo do sistema antigo e as limitações que trazia. Utilizei exemplos de casos reais onde o ERP reduziu erros de inventário e trouxe maior precisão.
Desejo: Convoquei líderes de cada setor para discutirmos como o novo ERP poderia facilitar suas operações diárias. Os ganhos em produtividade e a melhoria da precisão nos registros financeiros foram pontos que despertaram grande interesse, especialmente entre os operadores e supervisores.
Conhecimento: Organizei um programa de treinamento intensivo para os principais usuários, com módulos específicos para as diferentes funções dentro do ERP. Esse conteúdo era complementado por uma central de ajuda online com vídeos e guias de consulta rápida.
Habilidade: Na fase de habilidades, promovemos “treinamentos on-the-job”, permitindo que a equipe praticasse diretamente no sistema. Adotamos um formato de shadowing, onde um funcionário mais experiente acompanhava um menos experiente para acelerar a curva de aprendizado.
Reforço: Após o lançamento oficial, estabelecemos um programa de acompanhamento semanal durante os três primeiros meses para resolver problemas e reforçar boas práticas. Além disso, premiamos mensalmente os funcionários que usavam o ERP com maior precisão e frequência.
Com a implementação do ERP, a empresa conseguiu reduzir o tempo médio de processamento de pedidos em 40%, aumentando a capacidade de atendimento e reduzindo perdas por erro de inventário.
Caso 3: reestruturação da cultura organizacional em uma empresa de saúde
Em um projeto em uma empresa de saúde, a meta era transformar a cultura organizacional para um modelo focado em colaboração e atendimento humanizado. As dificuldades eram a falta de integração entre departamentos e um modelo hierárquico rígido que dificultava a comunicação.
Consciência: Conduzi uma série de reuniões abertas com todos os níveis hierárquicos para explicar as novas diretrizes. Mostrei como o atendimento humanizado impactaria a experiência dos pacientes e, em última instância, a imagem da empresa. Essa conscientização foi essencial para criar um ponto de partida positivo.
Desejo: Identifiquei líderes e influenciadores que já apresentavam um perfil mais colaborativo e humanizado e os envolvi em comitês de mudança. Eles atuaram como exemplos para seus pares, criando um desejo de transformação em outras equipes.
Conhecimento: Organizamos treinamentos sobre comunicação assertiva, técnicas de escuta ativa e princípios de atendimento ao paciente. Esses conteúdos foram adaptados para cada área, desde a recepção até os setores de atendimento médico e administrativo.
Habilidade: Implementamos um programa de mentoria, onde cada colaborador era orientado por um líder no novo modelo de atendimento. Esse acompanhamento foi vital para que o conhecimento adquirido fosse traduzido em habilidades reais.
Reforço: Estabelecemos novas práticas de feedback contínuo e reuniões de alinhamento entre setores. Essas práticas criaram um ambiente de troca constante, e os resultados foram monitorados trimestralmente para avaliar o impacto na satisfação dos pacientes.
Com essa transformação cultural, a satisfação dos pacientes aumentou significativamente, e a empresa também observou uma redução na rotatividade de colaboradores, indicando um ambiente organizacional mais integrado e positivo.
Caso 4: transformação digital em uma rede de varejo
Em um projeto de transformação digital para uma rede de varejo, o objetivo era digitalizar processos de gestão de estoque e atendimento ao cliente, criando uma experiência mais moderna e conectada para os consumidores. No entanto, a resistência era alta devido ao receio de que a tecnologia pudesse substituir a interação humana.
Consciência: A primeira ação foi demonstrar, com base em pesquisas e casos de sucesso, que a transformação digital não substitui o atendimento humano, mas o complementa. Apresentei dados que mostravam como a tecnologia poderia melhorar a experiência do cliente sem perder o toque pessoal.
Desejo: Para criar o desejo pela mudança, compartilhei histórias de sucesso de outras empresas de varejo que usaram tecnologia para personalizar o atendimento e oferecer soluções inovadoras. Isso despertou interesse, principalmente entre os gestores de loja, que começaram a ver a tecnologia como um diferencial competitivo.
Conhecimento: Criei um programa de treinamento focado no uso das novas ferramentas digitais, desde o software de controle de estoque até as novas plataformas de atendimento online. Os colaboradores receberam acesso a módulos de treinamento online e presenciais para garantir o domínio completo das ferramentas.
Habilidade: Promovemos um período de adaptação onde cada loja foi equipada com suporte técnico em tempo real para que os colaboradores pudessem aprender as ferramentas na prática. Essa fase prática foi crucial para fortalecer o uso das tecnologias no dia a dia.
Reforço: Para consolidar a transformação digital, implementamos KPIs específicos e recompensas para as lojas que atingissem as metas de engajamento com as novas ferramentas. Os feedbacks dos clientes sobre o novo atendimento digital também eram analisados para ajustes contínuos.
Como resultado, a rede de varejo aumentou suas vendas digitais em 60% e obteve um feedback positivo dos clientes sobre a melhoria da experiência, mostrando que a tecnologia, quando bem implementada, é um aliado poderoso para o varejo.
E sua empresa? Tem se preocupado e estruturar a gestão de mudanças?
Citação a CARVALHO, S.
Saulo Carvalho é Mestre em Gestão e Planejamento (UNITAU) stricto-sensu. Pós-Graduado em Comunicação e Marketing Empresarial (UMESP) lato-sensu, Graduado em Administração de Marketing (UMESP). Admitido em regime especial ao Doutorado sobre Pesquisa Operacional (ITA – Instituto Tecnológico de Aeronáutica e Universidade Federal de São Paulo).
Consultor empresarial com atuações no Brasil e América Latina. Ministra disciplinas de Administração, Marketing, Pesquisa e Planejamento Estratégico aos cursos superiores de Administração, Marketing e Engenharia. É pesquisador sobre Gestão, Marketing e Ambiente Econômico. Desenvolve e aplica pesquisas científicas sobre Gestão e Marketing.